Na disputa, vence quem oferecer o menor valor a partir da tarifa-teto fixada pelo governo. Como resultado, o preço médio das tarifas de geração, que vem aumentando desde 2012, tende a subir ainda mais.
Ao todo, o governo prevê quatro leilões de geração de energia e outros quatro para ampliar o sistema de transmissão. Os certames poderão gerar investimentos de até R$ 109 bilhões. Porém, especialistas acreditam que a crise econômica que afetou o caixa das empresas, o dólar alto e a redução dos financiamentos por parte do BNDES tornarão mais difícil o sucesso das rodadas.
Segundo a consultoria Safira, o preço médio da venda de energia nos leilões de A-5 (quando a energia só entra no sistema em cinco anos) por megawatt/hora aumentou à medida que a crise energética se agravou, com a falta de chuvas: subiu de R$ 91,25, em dezembro de 2012, para R$ 259,19, em abril deste ano.
"Essa alta reflete a percepção de um risco maior, já que os investidores passam por um cenário de crise mundial, o que acaba reduzindo o número de interessados. Com isso, o deságio acaba sendo menor, pois há menos concorrência. Há ainda o dólar alto, que encarece os projetos. O desafio para atrair investidores é a precificação do leilão, que tem de ser maior por conta ainda dos riscos regulatórios. A médio prazo, a tendência é de preços mais elevados", diz Fábio Cuberos, da Safira.
Edmar de Almeida, do Grupo de Economia da Energia da UFRJ, acredita que, apesar das dificuldades da economia brasileira, os leilões vão atrair investidores, mas a um preço muito alto para o consumidor: "Não tenho dúvidas quanto ao sucesso dos leilões, mas os preços da energia estão subindo muito".
Há ainda atrasos no cronograma, o principal deles é no complexo do Rio Tapajós, no Pará. A primeira usina, São Luiz de Tapajós, que estava prevista para ir a leilão no fim do ano passado, foi adiada para o fim deste ano. Com capacidade de 8 mil megawatts, é o maior projeto planejado para os próximos cinco anos. Para efeitos de comparação, Belo Monte terá 11 mil megawatts de capacidade. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, já admite novo adiamento no leilão, citando uma polêmica se o projeto atingiria ou não terras indígenas. Analistas acreditam que Tapajós será postergado também devido à redução dos investimentos da Eletrobrás e à crise nas empreiteiras desencadeada pela operação Lava-Jato.
Entre outros leilões de geração previstos para este ano, três são os chamados “reserva” — cujo objetivo é gerar energia a curto prazo. Mas a expectativa do mercado é com o leilão A-3, que prevê gerar energia a partir de 2018 e investimentos, segundo o governo, de R$ 74 bilhões com base nos 521 projetos cadastrados. O preço-teto ainda não foi divulgado.
Thais Prandini, diretora da Thymos, destaca que o desafio principal para o sucesso dos leilões é a questão do financiamento. Segundo ela, o BNDES, que até o ano passado financiava até 70% do projeto, reduziu para até 50% neste ano.
"Como vai se financiar esses empreendimentos? O custo será mais alto, até porque as linhas do BNDES são atrativas. E isso vai se refletir na tarifa. Assim, para atrair mais investimentos, há uma expectativa que o valor da energia continue aumentando. O caixa das empresas está curto".
O governo se mostra otimista. Tolmasquim, da EPE, afirmou que, independentemente das dificuldades econômicas, os projetos têm receita garantida ao longo de todo o período de concessão (de 30 anos). "Não tenho dúvida que vai ser sucesso (os leilões), dado o interesse grande dos empreendedores e da oferta maior de projetos do que a demanda".
Para Tolmasquim, as regras dos contratos para os projetos de geração foram ajustados à nova realidade, como a redução do financiamento do BNDES, o câmbio, o peso da importação de equipamentos, entre outros fatores, para torná-los atraentes. "O Brasil vai voltar a crescer e tem que ter energia para isso. Esses leilões são principalmente para aumentar a oferta de energia a partir de 2018".
Apesar de governo e analistas citarem a redução do patamar de financiamento do BNDES, o banco disse que “para os leilões, as regras são definidas caso a caso”. Otimista, o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Romeu Rufino, diz que há investidores com apetite, como os chineses. Em relação aos quatro leilões de transmissão, eles prevê investimentos de R$ 35 bilhões com as quatro linhas. A maior será de 2.500 quilômetros do chamado bipolo para transportar a energia da usina hidrelétrica de Belo Monte, em construção no Rio Xingu, no Pará.
"O setor elétrico não pode esperar a demanda crescer para correr atrás de obras. Precisa planejar a longo prazo. Mas é um desafio para a Aneel realizar os leilões, pode não ter investidores no nível necessário", admite.
Rufino cita dificuldades a serem superadas, como as questões socioambientais. Em nota, o Ministério de Minas e Energia (MME) disse que “investimentos em infraestrutura como esses são de longo prazo, e o peso de fatores conjunturais nas decisões é relativizado”.
Mas Thais, da Thymos, diz que o governo terá de elevar a tarifa para a geração e a receita anual permitida para a transmissão como forma de atrair as empresas.
"Chegar a esse volume de investimento é um desafio com as regras de hoje. Se não tiver mudança, com a elevação dos preços, podemos ter lotes vazios".
Correio da Bahia