A maioria dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu ontem que houve um esquema de compra de votos no Congresso Nacional no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entre 2003 e 2004.
A decisão sepulta a tese, defendida por Lula e outros líderes do PT, de que tudo não passava de um esquema de caixa dois para financiamento de campanhas eleitorais.
E confirma o principal ponto da acusação no processo do mensalão, de que o sistema financeiro clandestino montado pelo PT com o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza cooptou deputados e líderes partidários para que aprovassem projetos de interesse do Executivo.
Em sessões anteriores, a maioria do STF já concordara com outros pontos importantes da acusação, concluindo que o esquema foi alimentado por recursos desviados dos cofres públicos e empréstimos fraudulentos, e que o dinheiro foi distribuído de maneira dissimulada para despistar as autoridades.
A existência do mensalão foi revelada pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) em entrevista à Folha em 2005.
Jefferson foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP) e o ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE) foram condenados pelo crime de formação de quadrilha também.
Ontem o STF concluiu o julgamento das acusações aos políticos da base aliada (PP, PR, PTB e PMDB) envolvidos no mensalão e dos sócios da corretora Bônus Banval vinculados ao esquema.
O julgamento será retomado amanhã, quando o STF começará a julgar o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro Delúbio Soares, que são acusados de corrupção ativa e apontados como os responsáveis pela organização do mensalão.
A tese da compra de apoio político no Congresso teve o apoio de 7 dos 10 ministros do tribunal: Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ayres Britto.
O único ministro que concordou com a tese do caixa dois foi o revisor do processo, Ricardo Lewandowski. As ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia votaram pela condenação dos políticos, mas não deixaram clara a motivação exata pela qual eles teriam recebido os recursos.
Até mesmo Dias Toffoli, que trabalhou para o PT e o governo Lula, afastou a tese do caixa dois ao analisar o caso de Valdemar Costa Neto. O ministro considerou fraca a alegação da defesa de que os deputados do antigo PL iriam apoiar "naturalmente" o governo, já que o vice de Lula, José Alencar, era do partido.
"A meu ver ficou bem explicitada a razão pela qual seria necessário cooptar apoio daqueles parlamentares, bem como explica a necessidade de atendimento às suas solicitações de recursos capitaneadas pelo deputado Costa Neto, então dirigente maior do partido e líder da bancada na Câmara", disse Toffoli.
O ministro Marco Aurélio Mello foi mais direto: "O que houve, a meu ver, considerada a corrupção passiva, e que o dinheiro não cai do céu, foi a busca de uma base de sustentação [no Congresso]".
O voto de Celso de Mello, que durou mais de uma hora, foi uma das mais duras condenações da prática da compra de apoio parlamentar, ao descrever o mensalão como "vergonhosos atos de corrupção governamental".
Em seu voto, Ayres Britto definiu o esquema como uma "arrecadação criminosa de recursos públicos e privados para aliciar partidos e corromper parlamentares". E completou: "Projeto de continuísmo político idealizado por um núcleo político".
Após a sessão de ontem sobe para 22 o número de réus já condenados no processo do mensalão.
FOLHA