terça-feira, 7 de abril de 2015

Um governo precisa falar ao seu eleitor

Levantamentos realizados em algumas capitais mostraram que as manifestações do dia 15 de março tinham parcela significativa da classe média e da elite. Em Porto Alegre, preponderaram os que ganham de 6 a 10 salários e mais de 10 salários (Instituto Índex e Instituto Amostra). Em São Paulo, de acordo com o Datafolha, os que ganham entre 10 a 20 salários e os que recebem mais de 20 salários representavam, juntos, 41%. Se adicionarmos os que ganham entre 5 e 10 salários, o número sobe para 68%. Não vi dados do Nordeste, mas seria interessante tê-los para fazer comparação A tirar pelas pesquisas, não é absurda a tese de que há parcela que tem ódio do PT pela promoção da inclusão social e garantia de direitos e programas que restringem privilégios, como cotas para negros nas universidades e Bolsa-Família. E também não é absurdo pensar que, depois da emergência da classe C, a estagnação da economia e dos ganhos sociais faria esta se revoltar contra o governo, exigir mais.
Entretanto, a última pesquisa do Datafolha mostra o aumento da reprovação de Dilma Rousseff em todas as classes e aponta que os mais descontentes ganham entre 2 e 5 salários. Muitas hipóteses podem ser tiradas daí. A primeira é que um governo precisa falar ao seu eleitor. Principalmente, se disser uma coisa na campanha e fizer outra. A segunda é que os discursos da classe dominante se reproduzem na dominada, como disse Marx e reiterou Pierre Bourdieu. Rejeito a segunda por estudos terem mostrado que não se confirma integralmente, ou seja, o cidadão não é ente passivo, receptor sem questionamento dos discursos dominantes. Aliás, quero ampliar o sentido do termo e falar de discurso dominante como preponderante em determinado momento. No vivenciado agora, “impeachment da presidente” e “corrupção petista é a maior” são os que ganham eco entre agentes sociais que não fazem parte do campo político.
Se Patrick Champagne (sociólogo francês que estudou o jogo político de formar a opinião) está certo e política é, antes de tudo, luta simbólica por imposição de sentido, Dilma não vem perdendo apoio do eleitorado apenas pelos atos que contradizem sua campanha, mas também por se esquivar de entrar na disputa discursiva e assumir o lugar de fala de quem pode dar explicações e mostrar ações relacionadas ao apoio nas eleições. Não adianta colocar a culpa em FHC pela corrupção levada adiante; pelas medidas que afetaram o direito dos trabalhadores no novo governo. O PT tem que fazer mea culpa ou se torna co-responsável pelos raivosos pedidos de impeachment, que chegaram a descambar até em pedidos de intervenção militar e “intervenção militar temporária”, diante do desconhecimento sobre os atos do regime autoritário no Brasil, incluindo a corrupção no período.
 Joyce Miranda Leão Martins
joycesnitram@yahoo.com.br /Mestre em Sociologia pela UFC. Doutoranda em Ciência Política pela UFRGS e pesquisadora-visitante da Universidad Complutense de Madrid (UCM) /O POVO

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